25 Abril: Otelo disponível para recuperar MFA e mudar regime
Otelo Saraiva de Carvalho considera que a recuperação do Movimento das Forças Armadas (MFA) pode ser positiva, para travar «outras guerras» que não a colonial, e mostra-se disponível a participar numa «mudança de regime que valha a pena».
Aos 77 anos, o capitão de Abril afirmou à agência Lusa que já foi desafiado a concorrer à Presidência da República, mas frisa que, «como o regime está» não alinha, e não quer entrar «naquilo que o Spínola definiu como porca: a política».
Só aceitaria o desafio se algo de espantoso acontecesse, com «uma mudança de regime que valha a pena».
O agora coronel na reforma gostava de «participar numa qualquer mudança efetiva do país» e até já propôs a reconstituição do MFA.
«Já não há a perspetiva de travar uma guerra [como a colonial] que levava 40% do orçamento do Estado, e que todos os anos fazia mortos e feridos, mas há outras guerras para desencadear», adiantou.
Otelo diz que, nos últimos 40 anos, e principalmente nos que se seguiram à revolução, foi aliciado por partidos políticos e até «usado».
«O PS procurou aliciar-me várias vezes. Recebi convites de altos dirigentes para ser cabeça de lista, por exemplo, às eleições parlamentares, mas nunca aceitei, nunca quis hipotecar-me a nenhum partido», recordou.
Para Otelo, «os partidos sempre constituíram grupos de poder que lutam pelo poder, não em benefício de todo o povo, salvo medidas esporádicas, mas em benefício do próprio partido».
«Recusei sempre. Almeida Santos convidou-me várias vezes e o próprio Mário Soares aliciou-me para fazer parte do PS. O PSD foi o que menos se aproximou de mim. Em novembro de 1974 cheguei a ser convidado pelos elementos da Juventude Centrista para presidir a um congresso fundador da JC. Mas partidos não atraem a minha simpatia», declarou.
Otelo acredita que a sua popularidade foi usada, nomeadamente pelo Partido Comunista, que acusa de o enquadrar como elemento das Forças Populares 25 de Abril (FP 25), responsabilizadas por uma série de atentados nos anos 70 e 80, para o colocar na prisão e o afastar totalmente da vida política.
«Eu tinha anunciado que ia ser cabeça de lista da Força de Unidade Popular (FUP) nas legislativas que iam decorrer em outubro de 1984 e o PCP não estava disponível a sofrer uma derrota como a sofrida nas presidenciais, em que o seu número dois (Otávio Pato) foi amplamente derrotado por mim, que tive 17 por cento, e ele sete por cento».
Otelo sublinha que já várias vezes fez esta acusação, mas que «nunca houve ninguém do PC que tivesse dito o contrário».
O militar não tem a menor dúvida que se agora entrasse numa campanha qualquer, tipo presidenciais, ou outro processo eleitoral, haveria sempre um Paulo Portas, um Manuel Monteiro que diriam: “assassino, bandido, foi ele que mandou matar”.
«Nunca mandei matar ninguém. Tenho horror a qualquer assassínio. Liquidar um ente humano é para mim extremamente doloroso, não concebo que alguém o consiga fazer. E no entanto tenho este rótulo que me é dado, sobretudo pela gente de direita», disse.
Por outro lado, acrescenta, «este povo – este povo que eu amo – todos os dias vem ter comigo e diz “é preciso fazer outro 25 de Abril! Óscar [nome de código de Otelo], era preciso mais como o senhor. Volta!” Isso para mim é extremamente gratificante».
«Enquanto os políticos me classificam como assassino e bandido, o povo, que cada vez se reconhece menos nos partidos, tem comigo um laço de amizade muito grande».
Isto porque, para Otelo, o povo sentiu que, na época, participava no poder: «foi precisamente na altura em que eu estive a comandar – eu, que nunca quis o poder e fui empurrado para o poder – que o povo sentiu o poder e que participava na reconstrução do poder».
Otelo Saraiva de Carvalho tinha 37 anos, era major quando se deu o 25 de Abril e foi membro do Conselho da Revolução e comandante-adjunto do COPCON (Comando Operacional do Continente).
Nas presidenciais de 1976, ganhas por Ramalho Eanes, foi o segundo mais votado, com 16% dos votos.
Depois de um percurso político-militar atribulado, esteve preso na sequência do caso das FP-25 de Abril (1985), organização responsabilizada por vários atos terroristas, e libertado cinco anos mais tarde, após recurso da sentença de 15 anos.
Em 1996, foi amnistiado e em 2001 absolvido.





